NATURALIZAÇÃO E DETURPAÇÃO DOS VALORES E DAS CONDIÇÕES

 


O Brasil atual se encontra em um contexto globalizado, sendo afetado pelos desdobramentos culturais e mercadológicos que ocorrem nas nações mais poderosas. Diante disto, quando conhecemos obras como o célebre “Pornland”, livro escrito pela pesquisadora feminista de raiz Gail Dines a respeito da indústria pornográfica, percebemos que conforme a indústria se alarga e angaria um maior número de heavy users (consumidores viciados), a pornografia torna-se mais extrema e, em decorrência disso, a indústria cultural mainstream mais se pornifica.

Nesse sentido, a fim de que não haja um “choque de valores” entre os produtos culturais vendidos pela indústria e os seus princípios falsamente feministas, que são utilizados para agregar valor, se faz necessário que as mensagens mistas sejam transmitidas ao público em demasiada frequência , em especial, ao feminino.

Neste cenário, surgem os discursos neoliberais a cerca de uma suposta liberdade individual na hiperssexualização ou, até mesmo, na submissão ao sexo masculino. Afinal, na nova roupagem do patriarcado 2.0 em sua bem-sucedida aliança com o capitalismo, as classes oprimidas são convencidas de que a sua opressão é opcional e pode se tornar uma fonte de prazer e “subversão”.

Por fim, ambos os processos são acompanhados pelo poder histórico, político, social e econômico. É a combinação do preconceito e do poder que procura legitimar o racismo estrutural, a submissão feminina, o feminicídio, o trabalho análogo à escravidão, o abuso infantil e outras mazelas mais.

Com o princípio de que somos “cordiais” e “pacíficos”, preferimos não encarar o nosso monstro do passado, dos quais se destacam o longo período de escravidão e as duas décadas de ditadura sanguinária, entre muitas outras pendências.

Sem conseguir confrontar os fantasmas que nos assombram, procuramos, incessantemente, pela razão dos nossos males. Esses já foram os povos originários, os negros “de raça inferior”, os pobres, os “comunistas”, a esquerda, as feministas… 

É impressionante como não conseguimos enxergar o tanto que somos instrumentalizados por um elite que sempre esteve no poder, que trata a classe média como marionete e banaliza a pobreza, a ponto de tentar excluir a problemática da estratificação social, num dos países mais desiguais do mundo, vide agora, com mais clareza, com a tentativa do apagamento das Ciências Sociais na Academia e desse genocídio educacional, chamado de Reforma do Ensino Médio, que atinge diretamente a qualidade da educação, precarizando ainda mais os filhos e filhas da classe trabalhadora, do povo da periferia.

Fortalecer políticas públicas é papel do Estado e da sociedade – é tarefa fundamental desconstruir esse viés colonizador, normatizador e adaptativo que hierarquiza e legitima a violência do Estado. Devemos promover uma cultura crítica aos problemas sociais e aos retrocessos e incorporar em nossa atuação social a luta frequente por igualdade e justiça social para todos.

Não é preciso fazer muito esforço para se verificar o aumento da pobreza no país. Nos semáforos e áreas públicas e privadas, pessoas pedem ajuda para comer ou tentam vender algo para garantir a sobrevivência, muitas vezes de toda a família.

Não podemos permitir a persistência de formas contemporâneas de escravização no Brasil (vide matérias nos jornais das vinícolas), que demonstra como a flexibilização da legislação trabalhista e a legalização da subcontratação ou terceirização, concomitantes à precarização monumental do mundo de trabalho brasileiro, não fez outra coisa senão ampliar e intensificar a escravidão contemporânea, em razão de um processo histórico de permanência de formas transitórias ou híbridas de exploração da força de trabalho, como também acentuada pelos elementos dinâmico-conjunturais que marcam a fase contemporânea do capitalismo no dito mundo globalizado, o que contraria as versões oficiais e patronais que pontificam que apenas com reformas trabalhistas estruturais de signo neoliberal é possível “melhorar” as condições de vida e trabalho da maioria dos setores populares do Brasil. Típico discurso famigerado da elite do atraso, preocupada com a manutenção de seus privilégios e totalmente indiferente e nada preocupada com os direitos da classe trabalhadora.

De sorte que precisamos de uma reflexão crítica que promova uma discussão sobre concepções de pobreza, desigualdade e exclusão social a partir da sociabilidade capitalista e da constituição da questão social na realidade brasileira. 

Se faz necessário buscar e identificar as determinações históricas do nosso quadro social e apresentar reflexões para compreender a pobreza, a desigualdade e exclusão social na cena contemporânea e suas formas de manifestação e enfrentamentos, identificando as expressões da pobreza vigente e sua interrelação com os conceitos de classe, raça, gênero, bem como, com naturalização, criminalização e moralização da pobreza. 

Temos que promover a desnaturalização da pobreza e fazer saber que todos compreendam a concepção ideológica que rege nossa sociedade contemporânea e a importância de uma visão de totalidade no planejamento de políticas públicas que libertem as massas das algemas elitistas, escravagistas, preconceituosas, racistas, misóginas, e dessa maneira seja possível a formação de um  novo campo no tecido social, uma sociedade mais humanizada, democrática e harmoniosa. 

O enfrentamento a desigualdade social e a pobreza deve vir através da correlação de forças entre a sociedade civil e o Estado, com projetos sociais que apresentam sua base em forças sociais e sejam contrários aos projetos neoliberais. Os quais possuem um discurso que favorece o Estado social mínimo e o livre mercado que focam a superação da pobreza no auto capacidade que os indivíduos têm de superar a pobreza. 

O Estado deve intervir, através de políticas públicas, para diminuir a desigualdade social, com a redistribuição de renda, aumentando a participação política e valorizando a interculturalidade para que a solidariedade entre os grupos seja estabelecida. É um projeto de mudança de cultura na percepção de mundo por uma sociedade menos desigual.