DO ENCONTRO COM DJAGWÁ KARA‘I TUKUMBÓ
Por Luciano Mentros
Há poucos dias recebi na ¹EE DR JOÃO ERNESTO FAGGIN o indígena de etnia Fulni’o , adotado pela família guarani Mby'a Aldeia Rio Silveira – Boracéia – ²Claudino Djagwá Kara’I Tukumbó.
Ele foi doar um pouco do seu tempo para dialogar com alunos de uma comunidade muito carente no bairro Vila Clara, na capital de São Paulo.
Atuo há quase dois anos nesta unidade escolar e a carência é enorme, em todos os sentidos.
A vulnerabilidade social da região é enorme, sentida e presenciada todos os dias nos corredores da escola, na conversa com alunos e familiares nas situações mais distintas possíveis.
Para além de tudo, existe aquela necessidade latente de ampliar o universo cultural dos alunos, desenvolvendo a formação cidadã e a consciência crítica e nesse sentido levá-los a conhecer as nossas raízes através da cultura dos povos originários, é fator fundamental de consciência e reconhecimento daqueles que verdadeiramente são o nosso maior tesouro, os povos indígenas!
A palestra se tornou um momento histórico na escola, um contato direto com um representante da cultura dos povos originários, usando seu conhecimento para esclarecer várias questões acerca da vida e da história dos povos indígenas, desconstruindo visões erradas, versões distorcidas e mal contadas sobre nossa essência, que sabemos, que é fruto da concepção criada pelos colonizadores para apagar a nossa real identidade de nação.
A palestra foi ministrada para alunos do ensino fundamental II e do ensino médio.
Percebi durante a palestra que em muitos olhares de alunos havia um tal encantamento com a presença do indígena Djagwá Kara’i Tukumbó, assim como se revelava o enfretamento dos mundos quando eles tiveram a oportunidade de fazer questionamentos e levantar suas dúvidas, algo lindo, inocente, porém, que ao mesmo tempo demonstra o quão pouco conhecemos de nós mesmos!
E quão insuficiente tem sido as políticas públicas sobre como pensar a educação no Brasil, uma vez que, as diretrizes relacionadas ao ensino das relações étnico-raciais ainda não estão contemplando e causando impacto suficiente para que realmente entendamos as raízes do nosso país.
Seguimos, ainda, por uma realidade falseada que cegamente abraça o viés ideológico da ordem e do progresso, lemas cunhados em nossa bandeira, que mais servem para a destruição das matas e florestas, do extermínio da fauna e da flora, e consequentemente e lamentavelmente fazem ainda no século XXI o genocídio dos povos nativos do Brasil.
Precisamos acabar com o calvário da história marcada pela imposição da vontade e dos valores dos colonizadores que continuam promover a ação etnocida sobre os povos indígenas
Precisamos redescobrir o Brasil, olhando verdadeiramente nossa origem, só assim, reconstruiremos dignamente nossa sociedade - a nossa ancestralidade não pode ser ignorada!
A reflexão se torna forte e acontece quando na presença de um ser raiz como Djagwá Kara’i Tukumbó repensamos a nossa dita maneira civilizada de ser e aí enxergamos que cultura vazia, destrutiva e autoflagelada estamos envolvidos há séculos, resultando nesse modelo de sociedade que queima, que arranca, que derruba, que mata e acaba com o planeta de uma forma imparável e inconsequente.
Nas palavras de ³Davi Kopenawa Yanomami (xamã e líder do povo indígena Yanomami)
"Chega de seguir o que os “donos da cidade e da mercadoria” estão fazendo com o mundo!"
De modo que, a educação e o pensamento indígena precisam ser o nosso norte para a salvação do caos da terra
“Nós queremos pensar tudo junto, tudo articulado, a defesa da nossa terra dever estar articulada ao processo de escolarização dos nossos jovens para que eles aprendam e possam nos defender. Queremos que as escolas fortaleçam as nossas línguas, mas também ensinem os Yanomami a serem médicos, enfermeiros, professores, dentistas, pesquisadores. Também queremos continuar a nossa história, queremos que os jovens continuem interessados em ser xamãs, caçadores, pescadores, que saibam construir as suas casas e viver com os recursos da nossa floresta. A escola não é para virar branco!
(Davi Kopenawa)
Em tempo 1...durante todo meu período de estudante do ensino fundamental ao último ano da faculdade também nunca tinha tido essa experiência, esse contato direto com um indígena, o que me deram foi uma história romantizada da colonização e ou simplesmente a ausência do tema (exceção só da minha professora Eliane de História, que ia para além do currículo branco)
Em tempo 2...gratidão total e absoluta pela experiência necessária, provocativa, reflexiva e humanizadora propiciada pelo agora conhecido amigo CLAUDINO DJAGWÁ KA’ AGWY KARA’I TUKUMBÓ LIMA!
Que eu, que nós, aprendamos e lutemos pelo respeito e valorização dos Povos Originários!
¹EE DR JOÃO ERNESTO FAGGIN – Avenida Fúlfaro 141, Vila Clara, São Paulo-SP – DE SUL 1.
² CLAUDINO DJAGWÁ KA’ AGWY KARA’I TUKUMBÓ LIMA – indígena, etnia Fulni’o, Família guarani, Aldeia Rio Silveira - Boracéia. Ativista, palestrante, artesão, artista plástico, professor, músico, Bacharel em Teologia, escritor e presidente da associação indígena Ara Pyau. @lobotukumbo
³DAVI KOPENAWA – líder indígena, presidente da Hutukara Associação Yanomami.